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| Resenha:MAESTRI, Mário Os Senhores do LitoralConquista Portuguesa e Agonia Tupinambá no Litoral Brasileiro (séc. XVI)Porto Alegre, Ed. da Universidade / UFRGS, 1994. 168 págs. | ![]() ![]() ![]() ![]() ![]() ![]() ![]() ![]() |
Luís Carlos Lopes
Luis_Carlos_Lopes@revistapraxis.cjb.net
Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo e professor da Universidade Federal Fluminense.
"Preconceitos, o mais delicioso prato a ser devorado pelos historiadores", tal poderia ser o título desta resenha. O livro Os Senhores do Litoral: Conquista Portuguesa e Agonia Tupinambá no Litoral Brasileiro (século XVI), de Mário José Maestri Filho, é uma caixa de surpresas. Aborda um tema difícil em 168 páginas, subdivididas em 23 breves capítulos, uma introdução e uma conclusão. Uma obra onde o autor consegue manter um estilo acessível a neófitos e a especialistas, sem corromper a língua e prejudicar o texto, com uma excessiva preocupação de simplificar e vender para um mercado cada vez menos exigente na qualidade do assunto e da escrita. Aliás, coisa em moda, no país da história pesquisada, escrita e editada por pessoas sem quaisquer responsabilidades com o progresso de nossos estudos. Maestri surpreende num crescendo: é impossível parar de ler o livro sem chegar ao seu final.
O formato, a bela capa, as ilustrações e os tipos escolhidos pela editora UFRGS não poderiam ter sido melhores. Lê-se o texto, ou melhor, saboreia-se o livro, com muita rapidez e não se pára de pensar nos problemas do passado e do Brasil contemporâneo. Um tipo de história, infelizmente rara, que se debruça sobre nós mesmos, coloca o mundo de ponta-cabeça, para que possamos observá-lo e participar do processo com clarividência.
O autor usou como fontes a escassa bibliografia historiográfica sobre os nativos brasílicos, a crônica de época, em especial a riquíssima literatura produzida pelos intelectuais que viajaram ou viveram no Brasil do primeiro século da colonização, e alguns, porém muito significativos, documentos arquivais publicados. A sua capacidade de inferir nos faz rever conceitos e repensar os pilares que edificam a nossa cultura. Não se trata de uma abordagem romântica de seres que se perderam no tempo histórico. Essa obra consiste num marco teórico-investigativo para o desenvolvimento de novas pesquisas sobre o problema, agora, alicerçadas na convicção da historicidade desses povos e das relações dos mesmos com os colonizadores.
Na cornucópia dos problemas brasileiros, a questão dos povos nativos é recorrente. Desde o século XVI, inúmeros escritos tentaram deslindá-la pelos mais diversos ângulos. A partir do XIX, com a "invenção" das ciências sociais, o mesmo problema tem levado ao gasto sistemático de tempo, tinta e papel. Todavia, no domínio específico da história e da categorização antropológica desses povos, têm prevalecido preconceitos ancestrais, reproduzidos, travestidos e comunicados ad nausea por pesquisadores das mais variadas cepas e tendências.
A simplificação do problema é tão freqüente que não há exagero em dizer que é possível ler em textos eruditos, didáticos e paradidáticos, escritos nos últimos cento e poucos anos, as mesmas idéias que presidiram o domínio colonial sobre o território brasílico e a vitória lusa sobre os "tupinambás". Os preconceitos do XVI estão vivos nessa literatura e também nas mentalidades médias das populações que habitam o Brasil contemporâneo. No interior brasileiro e em muitas zonas urbanas é xingamento equiparar alguém aos povos nativos. Pois, ser índio significa, entre nós, ser preguiçoso, vadio, incapaz, em suma, inferior. As teses da vocação "natural" do africano para a escravidão e da "incapacidade" do nativo para o trabalho são muito populares. Palavras como bugres, selvagens e indolentes são de muito uso da população brasileira em geral, para designá-los. Na verdade, é indescritível o desconhecimento reinante sobre a história desses povos que habitam as Américas há mais de quarenta mil anos.
O livro em questão revê inúmeros arquétipos da formação cultural do brasileiro. A abordagem dos problemas do canibalismo, da nudez, da sexualidade e dos motivos da derrota dos "tupinambás" são pontos altos do livro. Maestri investiga e propõe soluções, sem o corolário da moral judaico-cristã. Um avanço sensível. Um discurso que fará corar pudicos infelizes e moralistas de plantão. O autor devorou todos os que, no passo e no presente, negam a humanidade dos povos nativos das Américas. Canibalizou preconceitos e construiu categorias novas e instigantes. O leigo irá percorrer as idéias que ele aprendeu na escola e terá a possibilidade de fazer a revisão necessária. O especialista acompanhará o autor nas suas acuradas discussões com a historiografia e suas novas interpretações de documentos há muito conhecidos.
Um simples olhar sobre o brasileiro de hoje nos permite verificar os traços biológicos indeléveis da presença autóctone, na formação de nossas populações. Em nosso alimento de cada dia, na toponímia, no idioma etc., está registrada a cultura dos nativos. Negando o seu próprio portador, o preconceito serve para manter a imutabilidade do mundo e para fazer vencer, repetidamente, aqueles que venceram no passado. Se, na civilização erguida após os descobrimentos, não há limite para a riqueza, não há, igualmente, qualquer trava que impe-ça o mimetismo do colonizador.
Caro Leitor, esperamos que a leitura deste artigo, pertencente à Revista Práxis número 4, Julho de 1995, tenha sido proveitosa e agradável. Caso se interesse pela leitura do livro 'Os Senhores do Litoral', do Prof. Mário Maestri, entre em contato conosco. Obrigado.
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