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| Resenha:LUXEMBURG, Rosa A Revolução RussaTradução: Isabel M. Loureiro Petrópolis, Ed. Vozes, 1991. 110 págs.
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Ricardo Antunes
| Prof. de Sociologia do Trabalho na UNICAMP, São Paulo. Autor, entre outros livros, de 'A Rebeldia do Trabalho', Ed. da Unicamp, Os Sentidos do Trabalho: Ensaio sobre a Afirmação e a Negação do Trabalho, São Paulo, Ed. Boitempo, 1999, e 'Adeus ao Trabalho? (Ensaio Sobre as Metamorfoses e a Centralidade do Mundo do Trabalho)', Ed. Cortez/Ed. da Unicamp. Membro do coletivo de sócios da Revista Práxis Ricardo_Antunes@revistapraxis.cjb.net |
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Num momento em que a completa desmontagem da barbárie (neo)estalinista no Leste europeu é por muitos entendida equivocadamente como "o fim do socialismo", é pertinente e saudável a leitura desses três ensaios de Rosa Luxemburg, sob o título de A Revolução Russa, que estampam a força da polêmica existente no interior do pensamento marxista à época da Revolução de Outubro.
O mais instigante é, sem dúvida, o ensaio escrito em 1918, que dá título ao livro da edição brasileira, onde, apesar de reconhecer que "A Revolução Russa é o fato mais prodigioso da guerra mundial", Rosa trava um intenso debate frente a várias das medidas tomadas por Lênin e Trotsky logo após a tomada do poder. Vale resgatar e enfatizar e isso é central nos nossos dias que Rosa tinha plena clareza da impossibilidade da vitória do socialismo russo se esse não fosse ampliado em escala internacional. A dimensão universalisante da revolução social, como condição para a plena efetivação do socialismo, era nítida na marxista polonesa: "Todos nós vivemos sob a lei da história, e só em escala internacional a ordem socialista pode ser introduzida.
Na Rússia, o problema só podia ser posto. Não podia ser resolvido (...) Ele só pode ser resolvido em escala internacional". Sem essa condição fundamental, "a maior habilidade e sacrifícios mais sublimes do proletariado de um único país enredar-se-iam inevitavelmente num caos de contradições e erros".
Sem ter vivenciado a deformação estaliniana do socialismo num só país, uma vez que foi barbaramente assassinada durante o governo social-democrata alemão em 1919, Rosa Luxemburg apontava para aquele que se mostrou o mais agudo problema enfrentado pela geração de Lenin, Trotsky e Bukharin, quando se evidenciou, no início da década de vinte, a franca recuperação do capitalismo frente às revoluções socialistas emergentes. E não é demasiado lembrar que Rosa estava, particularmente nesse ponto, em clara sintonia com as teses de Marx.
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Fotografia de Vladimir Lenin, discursando nas Ruas de Moscou A ênfase do ensaio A Revolução Russa, entretanto, estava dirigida para outras dimensões da processualidade russa pós-17: criticava a palavra de ordem dos bolcheviques, que propugnavam pela tomada e partilha imediata das terras pelos camponeses, o que, segundo Rosa, não levaria à propriedade social, "mas a uma nova forma de propriedade privada". Criticava também a tese da "autodeterminação dos povos", "oca fraseologia pequeno burguesa", que, sempre segundo a autora, subordinava-se ao nacionalismo e significava um retrocesso frente à política socialista.
A crítica mais áspera, entretanto, dizia respeito à dissolução da Assembléia Constituinte, logo após a instauração do poder dos soviets. Polemizando especialmente com Trotsky, Rosa defendia que a vitória da ditadura do proletariado, tese da qual era adepta, dependia da mais ampla e intensa participação das massas populares. Sua proposição buscava a realização de novas eleições, com ampla "participação pública". Achava que a "redução democrática" a que estava sendo impelida a jovem república dos soviets, acabaria significando um retrocesso. Reconhecia, entretanto, as agudas dificuldades então vivenciadas: "Seria exigir de Lênin e seus companheiros uma obra sobre-humana pedir-lhes que, em tais circunstâncias, criassem, como por um passe de mágica, a mais bela democracia, a mais exemplar ditadura do proletariado e uma economia socialista florescente". Mas, ao mesmo tempo, não deixava de alertar enfaticamente para os riscos de operar-se uma separação entre partido e massa, núcleo dirigente e o conjunto da classe. Temia que os marxistas russos obliterassem em alguma medida as diferenças entre o "essencial e o acessório, a substância e a contingência". Era, como se pode constatar, uma polêmica no interior da esquerda, sem a roupagem liberal que muitas vezes se atribui a Rosa Luxemburgo.
Acompanha esse volume também o texto Questões de Organização da Socialdemocracia Russa, artigo publicado em Die Neue Zeit (1903/4) onde polemiza fortemente com a concepção de partido defendida por Lenin em Um Passo à Frente, Dois Passos Atrás. Esse texto de Rosa mereceu resposta de Lênin, que enviou para o mesmo periódico sua tréplica. Kautsky, então editor de Die Neue Zeit, recusou-se a publicá-la.
O leitor encontra, finalizando o volume, o texto O Que quer a Liga Spartakus?, grupamento comunista do qual Rosa foi a principal elaboradora, que posteriormente se converteu no Partido Comunista Alemão (KPD) e pelo qual esse texto foi adotado como programa. Escrito por Rosa Luxemburg em 1918, essa proposta dos marxistas para a Revolução Alemã, então em curso, encontrava inspiração na Comuna de Paris: seu programa defendia o "armamento do proletariado", a "supressão do Parlamento", a "criação dos conselhos de operários e soldados" com mandatos revogáveis, eleitos por sufrágio universal, entre tantas outras propostas. A contra-revolução alemã impossibilitou a sua vigência.
Vale ressaltar que essa edição, em língua portuguesa, feita numa cuidadosa tradução de Isabel Loureiro, permite recuperar alguns elementos importantes de um debate intenso e multiforme, elaborado no interior do marxismo em uma de suas fases mais originais e que muitos, hoje, até mesmo no campo da "esquerda", querem descar-tar. Se os dilemas e impasses na viragem do século XX para o XXI têm, hoje, maior envergadura e novos desafios, a retomada desse debate no mínimo nos auxilia na retomada de questões relevantes que a tragédia estalinista procurou, de todas as maneiras, sepultar.
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Fotografia das Manobras do Exército Vermelho em frente ao Kremlin, na Praça Vermelha em Moscou
Caro Leitor, esperamos que a leitura deste artigo, pertencente à Revista Práxis número 3, Março de 1995, tenha sido proveitosa e agradável. Obrigado.
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